Decisão judicial ignora arquivamento anterior do STF e imunidade parlamentar garantida pela Constituição, gerando preocupação sobre liberdade de expressão

Em uma decisão controversa que levanta sérias questões sobre os limites da liberdade de expressão no Brasil, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) foi condenado pela Justiça do Distrito Federal ao pagamento de R$ 200 mil em danos morais por um discurso proferido na tribuna da Câmara dos Deputados. A sentença, divulgada nesta terça-feira (29), refere-se à manifestação do parlamentar durante sessão alusiva ao Dia Internacional da Mulher em 2023.
O processo foi movido por associações representativas da comunidade LGBTQIA+, que classificaram como transfóbica a manifestação do deputado. Na ocasião, Nikolas usou uma peruca amarela e declarou que “se sentia uma mulher”, criticando o que considerou como perda de espaço “das mulheres para homens que se sentem mulheres”.
A juíza Priscila Faria da Silva, da 12ª Vara Cível de Brasília, desconsiderou a proteção constitucional à atividade parlamentar ao determinar que o discurso não estaria amparado pela liberdade de expressão. “A conclusão a que se chega é a de que os dizeres proferidos pelo réu no púlpito da tribuna da Câmara dos Deputados na data de 8/3/2023 desbordam dos limites do direito à livre manifestação do pensamento e constituem verdadeiro discurso de ódio, na medida em que descredibilizam a identidade de gênero assumida pela população transexual e insuflam a sociedade a fazer o mesmo”, afirmou a magistrada.
A condenação na esfera cível contrasta diretamente com a decisão proferida anteriormente pelo ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), que arquivou notícias-crime apresentadas contra o deputado pela mesma razão. Na avaliação do ministro, as declarações de Nikolas estão protegidas pela imunidade parlamentar garantida pela Constituição Federal, sendo competência exclusiva da Câmara dos Deputados avaliar eventuais quebras de decoro.
O caso ilustra a crescente tensão entre o Judiciário e o Legislativo no país, com decisões judiciais interferindo diretamente na liberdade de manifestação de parlamentares eleitos democraticamente, mesmo quando estes estão no exercício de suas funções na tribuna do Congresso Nacional – local constitucionalmente protegido para o livre debate de ideias.
Especialistas em direito constitucional alertam para os riscos de precedentes como este, que podem criar um efeito silenciador nos representantes eleitos pelo povo e comprometer a independência do Poder Legislativo. Cabe recurso contra a sentença da juíza Priscila Faria da Silva, e é esperado que a decisão seja revertida em instâncias superiores com base na prerrogativa constitucional da imunidade parlamentar.
O deputado Nikolas Ferreira, conhecido por suas posições conservadoras e defesa dos valores tradicionais, ainda não se manifestou oficialmente sobre a nova condenação, mas já havia destacado anteriormente seu compromisso de defender suas convicções, mesmo diante de tentativas de silenciamento.