
A Câmara Municipal de Campo Grande decidiu arquivar o pedido de cassação do mandato da prefeita Adriane Lopes (PP), apresentado pelo ex-candidato a prefeito Luso Queiroz (PSOL). A decisão seguiu o parecer técnico elaborado pela Procuradoria da Casa, que apontou falhas formais na denúncia e ausência de fundamentação jurídica sólida para dar prosseguimento ao processo.
O pedido protocolado por Luso Queiroz alegava que a prefeita teria cometido infrações previstas na Lei nº 4.729/65 e na Lei nº 8.137/90, além de supostamente afrontar a Constituição Federal ao não reter tributos sobre parcelas remuneratórias de servidores municipais. A denúncia também acusava a gestora de causar prejuízo ao erário ao deixar de recolher Imposto de Renda e contribuição previdenciária sobre determinadas vantagens funcionais.
Falhas de admissibilidade
O procurador da Câmara, Luiz Gustavo Lazzari, destacou em seu parecer que a análise não se aprofundou no mérito da denúncia, limitando-se a verificar se o pedido atendia aos requisitos de admissibilidade. Segundo ele, os denunciantes instruíram a peça apenas com a Carteira Nacional de Habilitação, sem comprovar sua condição de eleitores em pleno gozo dos direitos políticos.
“Sob esta ótica, não sendo possível verificar qualidade de eleitor dos denunciantes, resta prejudicado o recebimento da denúncia em face da Prefeita Municipal”, apontou Lazzari em seu parecer.
Além disso, a Procuradoria ressaltou que a denúncia não apontou de forma clara e precisa qual das infrações listadas no art. 4º do Decreto-Lei n. 201/67 teria sido cometida pela prefeita, comprometendo o direito de defesa. “A capitulação legal é imprescindível para que o acusado possa exercer de forma ampla seu direito de defesa, o que não ocorre no presente caso”, pontuou o procurador.
Questão técnica sobre tributos
No mérito, o parecer esclareceu que a decisão administrativa de não retenção de tributos sobre determinadas parcelas salariais teve respaldo em parecer jurídico da Procuradoria do Município e em interpretação da legislação vigente. Lazzari destacou que a jurisprudência sobre a questão ainda não está pacificada pelo Poder Judiciário.
“Insta registrar que acerca da incidência de tributos e de contribuições previdenciária sobre vantagens funcionais de natureza indenizatória, como é o caso ora em análise, não há precedente vinculante do Poder Judiciário que pacifique o tema”, afirmou o procurador, citando posicionamentos do Superior Tribunal de Justiça nos casos REsp n. 1059703/SC e REsp n. 976.648/PE.
A procuradoria destacou ainda que não se constata renúncia de receita prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal, visto inexistir omissão deliberada na arrecadação de tributos ou concessão de benefícios fiscais sem observar os critérios legais.
Contexto da denúncia
Na denúncia, Luso Queiroz acusou a prefeitura de abrir mão de receita ao decidir não reter tributos sobre salários de um grupo específico de servidores. Segundo ele, dois dias após a folha salarial ter sido processada com a retenção do imposto e antes da disponibilização dos holerites, a prefeitura teria voltado atrás.
“A justificativa apresentada foi a de que a retenção poderia gerar desgastes com os servidores em ano eleitoral e dificultaria alianças políticas, considerando a real situação financeira da prefeitura”, alegou o ex-candidato no documento.
A prefeita Adriane Lopes, por sua vez, argumentou pela inépcia da denúncia, sob o argumento de não estarem preenchidos os requisitos previstos no Decreto-Lei n. 201/67, e indicou a inexistência de infração político-administrativa na situação narrada.
Decisão final e implicações políticas
Com o arquivamento do pedido, Adriane Lopes conquista uma importante vitória política, frustrando setores que viam na denúncia uma oportunidade de desgaste para a gestão municipal. A ala política ligada ao ex-prefeito Marquinhos Trad, adversário declarado da atual prefeita, observava com interesse a possibilidade de avanço do pedido de cassação.
A Procuradoria concluiu seu parecer afirmando que “não há como imputar à Prefeita Municipal quaisquer das condutas tipificadas como infração político-administrativa pelo art. 4°, do Decreto-Lei n. 201/67”, recomendando o arquivamento da denúncia.
Para a Câmara Municipal, a decisão traz segurança jurídica e evita a abertura de um processo de impeachment sem embasamento jurídico sólido, enquanto a prefeitura reforça seu compromisso com a transparência e a legalidade dos atos administrativos.
Adriane Lopes assumiu o comando do Executivo Municipal em abril de 2022, após a renúncia do então prefeito Marquinhos Trad, que deixou o cargo para concorrer ao governo do estado. Este foi o primeiro pedido formal de impeachment apresentado contra ela durante sua gestão.