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Cirurgia bariátrica: Novas regras ampliam acesso ao procedimento; veja o que muda

Nova resolução permite procedimento a partir dos 14 anos em casos excepcionais e inclui pacientes com IMC a partir de 30 que tenham comorbidades graves

Foto de JAFAR AHMED na Unsplash
Foto de JAFAR AHMED na Unsplash

O Conselho Federal de Medicina (CFM) revolucionou os critérios para cirurgias bariátricas no Brasil com a publicação de uma nova resolução nesta terça-feira (20). As mudanças, baseadas em evidências científicas recentes, expandem significativamente o perfil de pacientes elegíveis ao procedimento, com destaque para adolescentes mais jovens e pessoas com menor índice de massa corporal (IMC).

A flexibilização mais expressiva ocorre na faixa etária. Adolescentes a partir de 16 anos agora poderão realizar o procedimento seguindo os mesmos critérios aplicados aos adultos, sem necessidade de comprovação da consolidação das cartilagens das epífises de crescimento dos punhos, como exigia a norma anterior. Em casos excepcionais, até mesmo jovens entre 14 e 15 anos com obesidade grave (IMC acima de 40 kg/m²) e riscos clínicos relevantes poderão ser operados após rigorosa avaliação multidisciplinar.

“Se ele [o adolescente] preencher todos os pré-requisitos, tem condição de realizar o procedimento. Antes, não tínhamos estudos efetivos que mostrassem isso, mas pesquisas nacionais e internacionais evidenciaram que a cirurgia também tem benefícios e segurança para essas crianças”, explicou o médico Sérgio Tamura, relator da nova resolução.

Outra mudança substancial refere-se ao IMC mínimo necessário. A partir de agora, pessoas com IMC entre 30 kg/m² e 34,9 kg/m² poderão ser submetidas à cirurgia, desde que apresentem comorbidades graves, como diabetes tipo 2 de difícil controle, apneia obstrutiva do sono ou esteatose hepática avançada. Anteriormente, o limite mínimo era de 35 kg/m² com doenças associadas.

Tamura enfatiza que essa alteração reforça o verdadeiro propósito da intervenção: “A cirurgia bariátrica não tem finalidade estética ligada ao emagrecimento. Ela visa reduzir os riscos ligados à obesidade e melhorar a qualidade de vida.”

Para pacientes com IMC entre 35 kg/m² e 39,9 kg/m², a cirurgia continua sendo recomendada quando há pelo menos uma doença agravada pela obesidade. Já para aqueles com IMC acima de 40 kg/m², mantém-se a indicação independentemente de enfermidades associadas, com a recomendação de realização o quanto antes.

A resolução também atualiza as técnicas cirúrgicas permitidas. O bypass gástrico e a gastrectomia vertical (sleeve) permanecem como principais opções, enquanto a banda gástrica ajustável e a cirurgia de Scopinaro foram oficialmente contraindicadas. Alguns procedimentos antes considerados “experimentais”, como o duodenal switch com gastrectomia vertical e o bypass gástrico com anastomose única, ganharam reconhecimento normativo, embora ainda restritos a casos específicos.

“Estudos mostraram que elas são efetivas nos casos em que há a falta de resposta para o tratamento convencional, por exemplo”, explica o relator.

As exigências sobre a infraestrutura hospitalar também foram aprimoradas. Agora, a cirurgia deve ser realizada exclusivamente em hospitais de grande porte, com capacidade para procedimentos de alta complexidade, UTI e plantonistas 24 horas. Para pacientes com IMC superior a 60, são necessárias instalações especialmente adaptadas (camas, macas, mesa cirúrgica, cadeira de rodas) e equipe multidisciplinar adequada, devido ao maior risco de complicações.

A decisão do CFM chega em um cenário alarmante: três em cada dez brasileiros vivem com obesidade, segundo o Atlas Mundial da Obesidade 2025. No panorama global, a doença afeta mais de 1 bilhão de pessoas, com projeções de crescimento contínuo. No Brasil, 68% dos adultos têm IMC acima de 25 kg/m², classificando-os com sobrepeso ou algum grau de obesidade.

Recentemente, a própria definição da obesidade foi atualizada por especialistas, que passaram a incluir critérios além do IMC, como sintomas relacionados ao sistema nervoso central, vias aéreas superiores e sistemas respiratório e cardiovascular. Entre os riscos associados à condição estão diabetes tipo 2, doença arterial coronariana, AVC e diversos tipos de câncer.

A obesidade é reconhecidamente multifatorial, envolvendo aspectos genéticos, comportamentais, ambientais e metabólicos. Por isso, não existe uma solução universal para o problema. O tratamento pode combinar ajustes no estilo de vida, medicamentos específicos e, nos casos mais graves, intervenções cirúrgicas, sempre considerando as particularidades de cada paciente.

Na avaliação do relator Tamura, as novas diretrizes refletem o avanço do conhecimento científico sobre o tema e buscam oferecer respostas mais adequadas ao crescente desafio da obesidade no país, facilitando o acesso a tratamentos eficazes e seguros para um número maior de pacientes.